top of page

O PROCESSO DE SAIR DO ARMÁRIO E DAR DE CARA COM A FAMÍLIA

  • Foto do escritor: Daiane Guimarães Cruvinel
    Daiane Guimarães Cruvinel
  • 18 de nov. de 2020
  • 6 min de leitura

Ser LGBT fora de casa é uma realidade da grande maioria dos jovens da comunidade, religião, vergonha, medo e o conservadorismo que habita nas casas brasileiras impedindo a diversidade de entrar


Imagem por: Igor Afonso

“Esse foi um processo um pouco complicado na minha vida, porque a gente se assume para o mundo, o mundo sempre soube que eu era gay eu sempre fui gay fora de casa”.

O trecho acima corresponde a uma das respostas que Igor Afonso nos deu durante uma entrevista sobre sua trajetória como integrante da comunidade LGBTQIA+. O mundo tem sérios problemas em aceitar a comunidade LGBT, mas na verdade isso não é o que mais afeta o indivíduo que ocupa uma dessas minorias. Ter a aceitação do mundo não é algo que a comunidade sonhe, se cada um puder viver sua vida em paz e ser respeitado já basta. Mas esse sentimento de não precisar da aceitação do mundo, só funciona da porta para fora da casa de cada um.

Ver que o mundo e as pessoas que você não conhece não aceitam sua sexualidade, chega a ser cômico para a maioria dos LGBTs, o complicado é quando a repulsa e o olhar de desprezo vêm de quem nós amamos. O maior problema do gay, da lésbica, do bi e de todos os representantes das outras letras, começa dentro de casa. Alguns LGBTs nunca criam coragem de se assumirem para seus familiares, porque até mesmo aqueles que respeitam a comunidade alimentam o famoso pensamento “eu respeito, desde que não seja meu filho (a)”.

E a sexualidade não heteronormativa começa a se tornar um problema antes mesmo de se concretizar no indivíduo. A imagem do diálogo com a família e todos os problemas que podem resultar, se torna uma dor de cabeça e um meio que o LGBT encontra de negar sua própria existência. Tudo isso porque a negação vinda de quem mais se ama, a possibilidade de envergonhar a família, a caminhada oposta aos ensinamentos da religião (no caso das famílias religiosas), os futuros problemas financeiros e o caos familiar, são argumentos extremamente comuns entre as famílias conservadoras que descobrem em seus filhos uma sexualidade oposta à que eles esperavam.

Igor tem 21 anos e está concluindo o curso de Jornalismo na PUC Goiás. Igor é gay desde sempre, mas somente no ano passado teve com sua mãe a conversa clara e objetiva que informava sua sexualidade. Em entrevista, Igor nos conta como foi sua história de vida até que resolvesse falar, com todas as letras, que era homossexual e que nada no mundo iria mudar isso.

“A minha mãe sempre soube que eu era gay, porque a gente já tinha tido discussões sobre isso, ela sempre falou que não aceitava e eu passava por aquele processo de conversão para o mundo hétero. Mas para eu chegar nela e falar ‘olha, quero te dizer que sou gay e nada no mundo vai mudar isso’, foi só quando eu tinha 20 anos. Exatamente no dia do meu aniversário de 20 anos, ou seja, em junho do ano passado”, conta Igor.

A expectativa dos pais sobre a orientação sexual dos filhos começa desde o chá-revelação. Quando criança tudo é esquematizado, mesmo que não intencionalmente, para que o indivíduo cresça de acordo com a norma do comportamento hétero imposta pela sociedade. No caso dos meninos é o azul, os carrinhos, as namoradinhas, a impossibilidade de chorar e ser sensível, a necessidade de manter a postura e a voz grossa, o futebol e tudo aquilo que se encaixa socialmente no termo hétero masculino. Quando a família possui alguma religião que leva ao pé da letra o conservadorismo, ou faça parte de uma instituição homotransfóbica, a situação fica ainda mais complexa para o LGBT.

Igor foi criado dentro do evangelismo e do protestantismo, um dos comentários mais comuns que ouvia em casa era que Deus não iria perdoá-lo. Ele afirma que possui muitos amigos também LGBTs, mas que até hoje não se assumiram para suas próprias famílias, justamente por conta da religião.

O comportamento da família é proveniente daquilo que os outros vão pensar. O maior medo dos pais é que seus filhos LGBTs ou que sua família, vire assunto no almoço da casa do vizinho, da tia ou do pastor. E aí identificamos mais um dos alicerces da LGBTfobia: a crítica e a pena que uma parcela da sociedade sente tanto da família quanto do jovem LGBT. Uma prova deste comportamento são os comentários como “tadinho né, tão bonito e é gay”, “nossa coitada de fulana, criou ciclano tão bem e o menino é gay”, que ouve-se com frequência das mais variadas classes da sociedade.

As famílias que geralmente fariam comentários assim e diriam que isso é apenas opinião (quando sabemos que não passa de preconceito velado), são as mesmas que ficam extremamente preocupadas com aquilo que a sociedade vai pensar de seu filho ou filha, caso estes se assumam LGBTs. E assim criam não só filhos amedrontados, como também filhos preconceituosos. A família educa o filho para ser heterossexual, com a ideia de que a sexualidade é algo padrão, universal, natural, imutável e divino, e acabam sendo vítimas, junto com seus filhos, de uma educação conservadora.

“Antes a minha mãe ficava sabendo por outras pessoas sabe, alguém vinha e comentava “ah nossa vi o Igor postando uma foto assim”, “vi o Igor postando uma foto com um cara” ou “vi o Igor com um cara na rua”. Nessa época a gente tinha mais atrito, minha mãe ameaçava parar de pagar a faculdade. Na época eu era muito religioso então ela usava o discurso da religião pra me impedir de continuar com a minha vida gay”, conta Igor sobre o preconceito de sua mãe, que partia do incômodo pelos comentários alheios e dos dogmas religiosos.

Ainda hoje, dezessete meses após Igor ter se assumido LGBT e ter informado que vai continuar sua vida com sua sexualidade independente do que pense sua família, quando ele está saindo e comenta que vai para a casa de sua sogra, é submetido a comentários inconvenientes, porque de acordo com ele, sua família só acredita que ele terá sogra quando estiver namorando uma mulher.

Outra pauta às vezes conflitante é sobre o relacionamento. A família com o tempo vai aceitando e entendendo que a orientação sexual daquela pessoa LGBT é aquela e pronto e que não vai mudar por desejo familiar. E aceitam o fato do filho, por exemplo, ser gay. Mas quando finalmente o filho em questão entra em um relacionamento é quando todos os medos dos familiares são colocados a prova.

“Depois que minha família percebeu que não adiantaria ficar falando, repetindo, brigando e tudo mais, a convivência melhorou um pouco. Hoje em dia eu falo “olha eu namoro, tô indo pra casa do meu namorado”, eu falo do meu namorado aqui em casa, falo dele o tempo todo, porque eu quero naturalizar o fato de eu poder falar do meu namorado pra minha família”, disse o entrevistado.

Igor é um dos ícones LGBT que o site Mundo LGBTQIA+ se propôs a contar a história. Independente de tudo pelo que passou durante sua infância e adolescência, na escola e, principalmente, dentro de casa, Igor hoje é feliz. Tem um relacionamento incrível com seu namorado Tiago e além de contar sua história para inspirar outras pessoas e conscientizar a sociedade, ele também se posiciona sempre nas redes sociais perante as injustiças e as vitórias das minorias LGBT.

“Minhas redes são completamente abertas, falo sempre sobre o movimento LGBT, sou muito militante da causa LGBT, então eu gosto sempre de trazer a realidade do que está acontecendo. Eu gosto muito de trazer notícias que falam, primeiro sobre as conquistas do movimento LGBT, mas eu também dou visibilidade para o lado negativo, eu falo em questão da violência. Porque o movimento LGBT já é muito negado pelas pessoas, é como se o movimento estivesse pedindo direitos básicos, então quando a gente mostra o que realmente está acontecendo, as pessoas entendem que a militância pelo movimento LGBTQIA+ precisa existir. E eu falo sobre meu namoro, falo sobre tudo, e não só nas redes sociais, em qualquer espaço que eu estiver eu falo“, conclui Igor.



Comentário da escritora: Eu sempre soube que essa matéria precisava contar a história do Igor, só de conviver com ele e ver um pouco da luta dele pelos corredores da faculdade eu sabia que a história desse ser humano iluminado precisava ser contada. O Igor me encheu de áudios (pra variar), igual quando trabalhávamos juntos no CA e na atlética, e dessa vez eu conheci um Igor que não conhecia, com uma história de vida inspiradora! Eu te desejo o mundo em forma de sucesso e de felicidade. Obrigada por ter me ajudado TANTO no meu trabalho ❤️🌈 I love you bitch!

Comments


  • Preto Ícone YouTube
  • Preto Ícone Spotify
  • Ícone preto do Instagram
bottom of page