"Uma das meninas que minha amiga levou, olhou e disse 'Nossa eu não acredito! Que desperdício!' "
- Daiane Guimarães Cruvinel
- 29 de nov. de 2020
- 4 min de leitura
Meu nome é Ivan Cardoso de Souza e sou hoje design de interiores e também trabalho com marcenarias na cidade de Rio Verde.
Atualmente, eu tenho três marcenarias que trabalham em cima dos meus projetos. Eu diria que não faço parte da minoria da comunidade, mas eu faço parte da comunidade Gay (que já não é mais tão minoria). Eu nunca senti a necessidade de me assumir, nunca senti a necessidade de chegar e contar para as pessoas e para minha família.
Então eu só sempre fui o que eu realmente sou, eu sempre parto da situação de que, se você quer respeito, você impõe o respeito também, então a partir do momento que você conta da sua vida, conta da sua orientação para as pessoas, é como se você tivesse procurando aceitação dessas pessoas, e é por isso que eu nunca cheguei a me assumir, falar “olha, eu sou gay”, eu sempre parti do pressuposto que, da minha vida cuido eu, então não tem o porquê de eu me assumir.
Sobre minha profissão como design de interiores, a maioria dos rapazes da minha faculdade que eu pude observar, eram gays. Eu me perguntava o porquê disso, mas acredito que não tenha uma explicação. Não somos nós que escolhemos a nossa profissão, é a profissão que nos escolhe. Mas querendo ou não, o público gay tem uma mentalidade cultural, tem mais facilidade para desenvolver algo legal e criativo. Nós temos uma habilidade artística maior. Para mim, acredito que essas habilidades surjam pelo fato de nós termos a curiosidade de saber sobre várias outras coisas, que às vezes o restante da população não se interesse tanto, e acabamos criando um HD dentro da nossa cabeça, com cores, ideias, formas, criatividade e tudo isso combinado de uma forma bonita que agrade personalidades específicas.
Quando eu fazia faculdade os melhores projetos de interiores, de pesquisas e trabalhos apresentados em sala de aula, eram dos gays. Tinha hétero que fazia? Tinha, mas parecia que a produtividade intelectual dessas pessoas era menor. Parece que eles se restringiam, com medo de mostrar o talento que tinham na arte. Como se repetissem para si mesmos ”nossa se eu colocar essa parede rosa aqui, eu vou ficar parecendo um viadinho”, então muitos héteros não se dão bem em profissões mais criativas e artísticas, por julgarem que cores, detalhes e arte, são características homossexuais.
Infelizmente o que a gente notava era nessa situação. Por eu trabalhar sozinho eu não tenho integrantes que trabalham comigo que são da comunidade, mas eu tenho amigos, que são até meus concorrentes, que são gays. Hoje, encontrar na minha profissão alguns escritórios que tenham como colaboradores, em sua maioria, integrantes da comunidade LGBT, é difícil.
Primeiro porque existem pouquíssimos escritórios, mesmo que com héteros, dentro da minha área ganhamos mais se trabalharmos sozinhos.
Nunca sofri nenhum tipo de constrangimento, nem quando eu trabalhava em outros lugares, nunca me senti excluído nem menosprezado, resumindo nunca passei por nenhum tipo de preconceito explícito. Nunca fui atacado de nenhuma forma negativa, nenhum hater entrou e começou a me atacar ou falar coisas negativas de mim ou da minha orientação, jamais, mesmo as minhas redes sociais sendo públicas, ninguém nunca me atacou.
Sobre me descobrir, a gente não se descobre, a gente nasce, desde criança isso sempre foi fluido em mim, eu tentei ser hétero, ter um relacionamento hétero, mais não foi algo que deu certo porque eu nasci gay, e eu acho que a pessoa que não se assume, que tenta levar uma vida hétero de mentira é uma pessoa triste, amarga, que hoje é preconceituosa porque não teve a coragem que muitos tiveram de falar “eu sou gay pronto e acabou”.
Eu conheço e até tenho amigos que tentaram ficar anos casados com mulher, tiveram filhos e que chegaram em uma determinada fase da vida que disseram “eu não aguento mais”.
Lá em casa a minha família super aceitou, o meu irmão também é gay, então pra eles foram super tranquilos, hoje a gente leva os nossos namorados em casa e não existe o preconceito, nem o ódio. Os meus amigos e amigas me respeitam também, de uma maneira que eu chego me emociono. Eu frequento casas de amigos que têm filhos pequenos ou adolescentes, que não me proibiram de ir a suas casas, porque existem pessoas tão preconceituosas que, quando têm filhos a família fica com medo que um gay frequente sua casa para não influenciar a criança.
Sobre preconceito, rolou na época da escola, mas eu nem entendi que era preconceito. Um amigo meu me chamava de pera, eu nunca entendi o que era, eu chamava ele de melancia por ele ser gordinho, e só depois fui entender que aquele apelido era por conta do meu comportamento não heteronormativo.
Nunca tive medo de ser atacado, até porque como eu sou do meio gay, eu sempre fui discreto, tanto no meu modo de andar, de me vestir, isso leva as pessoas a creem quando me veem que eu sou hétero, eu não sou do meio gay afeminado, teve uma vez que eu estava em um bar com meu namorado e mais uma amiga minha e ela levou duas amigas que eu não nos conhecia, quando a gente chegou e sentou uma das meninas que minha amiga levou, olhou e disse “Nossa eu não acredito! Que desperdício!”, aí eu fui e falei “Por que desperdício? A gente se gosta, então não é desperdício nenhum”, ela ficou chateada, e fez o comentário porque certamente achou que minha aparência era de hétero e que por isso eu estava desperdiçado, ou seja, tinha tudo pra ser hétero, e não era. As pessoas hoje têm na cabeça que o gay tem que ser afeminado, tem que se transvestir, e não é assim que as coisas acontecem.
Obs.: Imagens da galeria por Ivan Cardoso
Comentário da escritora: ahhhhh perfeição!! Estou muito feliz de ter conseguido um encaixe na sua agenda kkkkk e ter tido a oportunidade de contar sua história. Não nos conhecemos Há tanto tempo, mas por amarmos uma doida em comum e conviver com você toda semana, já desenvolvi um carinho e uma admiração surreais. Queria te parabenizar pela pessoa e pelo profissional que você é, tenho certeza que seu sucesso só vai se multiplicar a cada dia, porque vai ser inevitável. Ah, e sobre as fotos? Não consegui escolher uma por motivos de "PARA DE SER MARAVILHOOSO" hahaha!!!
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